João da Silva, 45. Ana Maria Silva, 38. Duas pessoas completamente diferentes, mas que viveram o mesmo problema. A grande paralisação dos caminhoneiros. Ele, homem da estrada há mais de 20 anos. Aprendeu com o pai, que por sua vez aprendeu com seu pai, os prazeres e as dificuldades de dirigir caminhão, com sol e chuva, noite e dia.
Ela, doméstica, mulher simples, mora em um bairro qualquer, de uma grande cidade. Acorda todos os dias as 5h da manhã, deixa o café de seus três filhos pronto e vai para o ponto de ônibus. Serão duas horas dentro de um ônibus até chegar à casa da Dona Maricota, senhora rica de um bairro de luxo. Há mais de 15 anos, Ana Maria bate ponto diariamente por lá. Limpa, cozinha, cuida da patroa.
Com a greve, João parou seu caminhão, que ainda paga, com o seu próprio suor, no trevo da grande cidade em que vive. Ele, seu pai, José da Silva, e vários colegas de estrada estão por ali. Homens que levam o sustento para dentro da casa de Ana Maria, da Dona Maricota, para a minha e a sua casa.
A doméstica, Ana Maria, vai ao supermercado, pouco consegue comprar. Frutas e verduras? Nem que pague caro, não há mais. A greve está brava. Chega a hora de ir para sua humilde casa, enfrenta dificuldades para conseguir ônibus. Os horários das empresas de transporte estão reduzidos. Começa a faltar diesel. Carros são poucos nas avenidas. Não tem gasolina. Está difícil viver no país em greve.
Quase dez dias. Caminhões parados. João da Silva está cansado. Mas não é só ele. Não é só o seu José da Silva, não é só a família Silva. Não está cansada da greve apenas a Ana Maria. A Dona Maricota, que nem sai de casa, também sofre.
_ Cadê minha maçã e meu mamão papaia, Ana? – pede a velha, acamada.
_ Senhora, o gás vai acabar. Terei que fazer almoço no micro-ondas, porque gás não há mais – responde a pobre doméstica.
O governo faz propostas. Mas João da Silva acha pouco. Seu pai e seus colegas de jornada, também. João chora com os filhos ao telefone. Sua esposa também sofre e chora. Mas quantas noites não rezou, chorando, para que Deus, de seu esposo cuidasse, pelas estradas do Brasil? Quantas vezes João saiu sem saber se voltaria para o seio da sua família?
E o governo, e o povo, e muitos de nós, nem paramos para pensar o quanto sofrem João, José e tantos outros heróis das estradas cada vez mais caras com pedágios, mais esburacadas. Fora o combustível elevado, que não para de aumentar.
O que Ana Maria, Dona Maricota, eu e você passamos nos dias de paralisação, nada são, comparados ao dia a dia de sofrimento da família Silva, e de tantas outras por aí.
Mas a greve terminou. Pouco se conseguiu. A luta continua, meu irmão! E agora, João? E agora, José? É voltar para as estradas. Voltar ao árduo trabalho. Ana Maria faz fila no mercado, maçã, mamão, gás, não podem faltar para a Dona Maricota.
E agora Brasil? E agora nosso bolso? E agora você?
Rodrigo Antonio Toigo