COTIDIANO

Como toda manhã ele fazia, acordou logo depois das sete horas. Foi ao banheiro, tomou banho, escovou os dentes e foi à cozinha. Estranhou, pois sua esposa ainda não levantara para fazer o café.

_ Bem, vou deixar que ela durma um pouco mais, afinal, ela merece.

Então, esquentou a água e preparou seu próprio café. Após comer alguns biscoitos, pegou a chave do seu carro e dirigiu-se a garagem. Ao entrar no carro, colocou a chave na ignição, não obteve resposta alguma. Tentou mais uma vez, e outra, e outra, e nada. O carro parecia estar morto.

_ Que droga, enchi o tanque ontem.

Mas como o dia estava quente e ensolarado, ele resolveu ir a pé. Afinal de contas, sempre é bom caminhar pela manhã. Saiu de casa, e logo reparou o monótono silêncio que havia pelas ruas. Viu-se sozinho. Olhou no relógio. Quase oito horas. Lembrou-se do dia anterior. A cidade neste mesmo horário estava movimentada. Pessoas correndo pelas ruas, carros, buzina, gritos. Mas hoje, tudo tranqüilo e parado. O jornaleiro que ele sempre via, não viu. A banca da praça que sempre neste horário estava cheia de estudantes que iam para os colégios estava fechada. A padaria que servia café fresquinho diariamente, fechada. As lojas, farmácias, supermercados, que neste horário estavam começando a abrir, estavam todos fechados. Estranho. Ninguém na rua, ninguém nas calçadas.

Apenas a Igreja estava aberta. Estranho, pois, normalmente neste horário a Igreja deveria estar fechada, pois era muito cedo. Olhou para o relógio novamente. Já passava das oito horas. Pensou que tivesse se adiantado, pois o seu relógio poderia estar com problemas. Olhou para o céu. Estranhou. O sol já estava no lugar que neste horário sempre estava. Preocupou-se.

_ Cadê todo mundo? Bem, quando eu chegar no escritório vou perguntar aos outros.

Caminhou mais um pouco e viu um carro, olhou e viu que nele estava o padre. Cumprimentaram-se, e ele continuou seu trajeto pela avenida deserta. Olhou para o lado e viu que uma moça abria a farmácia. Falou para si mesmo:

_ A cidade está atrasada hoje – e sorriu.

Ao passar pela moça da farmácia disse bom dia e entrou. Falou que veria o seu peso. Mas na verdade queria apenas conferir a hora no grande relógio acima da balança. Era oito e dez, seu relógio estava certo. A cidade estava realmente preguiçosa. Sorriu, despediu-se da moça e saiu. Bonita moça, pensou ele, com malícia.

Faltavam duas quadras para chegar ao escritório em que trabalhava. Era contabilista. Cheio de trabalho, como sempre. Terei um dia cheio, pensou. Caminhou mais um pouco, agora pensando nos relatórios que teria ao longo do dia. Parou surpreso. A porta do escritório estava fechada. Procurou a chave pelos bolsos, pensando em como os outros funcionários estavam atrasados, se o seu patrão soubesse, todos, inclusive ele, levariam uma boa bronca. Mas e o chefe? Se o escritório estava fechado, ele não havia chegado também. Após procurar em todos os bolsos, lembrou que deixara a chave dentro do carro.

_ Droga – Resmungou, com raiva.

Pegou o celular e ligou para sua esposa. Ela não atendeu.

_ Deve estar dormindo ainda. Mas que raios aconteceu hoje? Todo mundo está dormindo? Menos eu, o padre e a moça da farmácia?

Decidiu voltar para casa. Apenas a farmácia aberta. Passou pela Igreja. Algumas pessoas estavam entrando.

_ Hum! Missa? Essas horas? Alguém deve ter falecido.

Rapidamente, chegou em sua casa, foi até o carro conferir se achava a chave do escritório. Achou. Olhou no relógio, era oito horas e trinta da manhã. Resolveu chamar sua mulher, afinal de contas já era hora de estar em pé.

Entrou na casa. Tudo silencioso.

_ Lembrar de despedir a empregada. Quase nove horas e ela ainda não apareceu. Isso é uma falta de respeito.

Entrou no quarto, sua esposa ainda dormia, como um anjo. Por um tempo, parou na porta e ficou analisando o belo rosto que sua esposa tinha.

_ Bom dia – falou.

Ela não respondeu e ele insistiu, quase gritando. Ela, assustada, acordou e perguntou: _ Bom dia meu bem. O que faz acordado?

_ Quem deve uma resposta é você. Quase nove horas da manhã e ainda na cama. A empregada ainda chegou. A cidade toda está vazia, fechada, com exceção da farmácia da avenida e a Igreja. Até o pessoal do escritório ainda não chegou. E, claro, sem falar no carro que não funcionou. Estou achando tudo isso muito estranho.

_ Estranho meu bem? Isso é normal, vem deitar aqui comigo, afinal de contas hoje é domingo!

Rodrigo Antonio Toigo